São já demasiadas as vezes, em que penso ou sinto – não fosse já pensar e sentir tão difícil e cansativo – que parece que o peso do mundo inteiro recai sobre os meus ombros. A caminho do trabalho, a cada passo, sinto que preciso de atravessar oceanos inteiros para atingir o meu destino. Mas afogo-me em areias movediças que nunca me permitem chegar, impedindo-me de voltar para trás. Congelo.
“Tens um ar cansado, estás bem?”.
Não é cansaço. Mas eles não entendem. Não os culpo, a verdade é que não têm como saber. Não sei como lhes explicar. Porque eu também não entendo. Não é cansaço, é um tipo de exaustão, que começa nos ossos e espalha-se por todo o lado. O que posso fazer é o que esperam de mim: sorrir. E vou responder que está tudo bem, porque dizer a verdade parece impossível. Ou pior, desnecessário. Ninguém quer estar ao pé de pessoas tristes. A tristeza é como uma pandemia que não exige confinamento, mas muito mais contagiosa que qualquer outra. E ninguém quer estar ao pé de pessoas tristes.
No outro dia estava a andar no meio da multidão e perguntei-me se alguém notaria que eu estava ali. Melhor, se alguém notaria se eu não estivesse ali. E se o silêncio que eu, efetivamente deixasse, seria um alívio, ou abriria uma ferida. Pode ser cruel pensar assim, bem sei. “E as pessoas que tu deixas?” Mas eles não entendem. Eles não entendem que este senhorio que é a nossa mente pode ser o nosso pior inimigo, um crítico implacável que nos sussurra as maiores atrocidades na forma de gomas, rebuçados, bolos de chocolate e depois…depois já está.
O que eu mais queria era deixar de sentir. É isto que queria que entendessem. No fundo não quero morrer. Quero matar a parte de mim que sofre. Quero paz. Uma pausa para respirar, vir à superfície e respirar sem sufocar. Um momento em que possa existir sem lutar contra mim mesmo.
Hoje acordei e está um dia de sol. No meio do desespero, uma pequena faísca lembra-me que, talvez, só talvez, possa haver algo mais para além da escuridão. São aqueles momentos em que me lembro que pedir ajuda não é fraqueza, é coragem, e que falar sobre isso ainda é o primeiro passo para transformar o vazio nalguma coisa que eu ainda não compreendo.
Se eu aqui estou hoje, a escrever isto, é porque hoje acordei e ainda é um dia de sol. É porque ainda existe o sol para mim. E, por menor que seja a faísca que arde dentro de mim, ela é a prova de que ainda tenho força. Talvez o próximo passo não seja perfeito, mas será um passo. E isso é o suficiente por agora.
Carolina Pascoal
Psicóloga Clínica