A Fala é uma atividade cognitiva e motora complexa, que se manifesta através da articulação/produção de sons. Esta produção depende de um planeamento motor, de uma execução motora e de um planeamento linguístico (que depende da aquisição do sistema gramatical) (Bacelar, 2013).
A aquisição dos sons da fala é um processo gradual, que ocorre ao longo dos primeiros anos de vida e que depende do desenvolvimento linguístico e do desenvolvimento motor da criança (Reis, 2018).
Durante este percurso, algumas crianças podem demonstrar dificuldade na produção da fala (sons da fala), que podem ser típicos/normais e existe um período expectável para a criança conseguir produzir, ou podem ser erros que já não são esperados para a idade. Quando, na produção da criança, existem erros que não são esperados para a sua faixa etária, podemos estar perante uma Perturbação dos Sons da Fala (Reis, 2018).
As Perturbações dos Sons da Fala podem subdividir-se em cinco subtipos (Dodd, 2014):
– Perturbação Articulatória – a criança não consegue produzir sons específicos;
– Atraso Fonológico – a criança realiza erros que ocorrem no desenvolvimento típico, mas já fora do período esperado;
– Perturbação Fonológica Consistente – a criança apresenta processos atípicos, demonstrando não dominar o sistema;
– Perturbação Fonológica Inconsistente – a criança apresenta erros típicos não esperados na sua idade, juntamente com erros atípicos, e ainda apresenta produções inconsistentes para o mesmo som, ou seja, não realiza sempre o mesmo erro para um mesmo som;
– Dispraxia/Apraxia da Fala Infantil – a criança apresenta dificuldade em fazer o planeamento motor da fala, tendo um padrão de produção semelhante ao de crianças com perturbação fonológica inconsistente.
Por forma a melhor compreender o que é esperado no desenvolvimento típico e a identificar possíveis dificuldades, Mendes et al. (2013) referem que:
– até aos 3 anos e 6 meses, a criança adquire as vogais orais e nasais e deve adquirir as consoantes /p/, /t/, /k/, /b/, /d/, /g/, /f/, /s/, /ch/, /v/, /m/, /n/, /nh/, /R/ forte;
– entre os 3 anos e 6 meses e os 4 anos, a criança deve adquirir as consoantes /l/, /lh/, /ch/ em coda (ex.: pesca);
– entre os 4 anos e os 4 anos e 6 meses, a criança deve adquirir as consoantes /z/, /J/, /r/ fraco, /l/ em ataque ramificado (ex.: planta);
– entre os 4 anos e 6 meses e os 5 anos, a criança deve adquirir o som /r/ em coda (ex.: porta);
– e entre os 5 anos e os 5 anos e 6 meses, a criança deve adquirir o som /r/ em ataque ramificado (ex.: prato).
Existem sinais de alerta, referente a uma possível Perturbação dos Sons da Fala, a que o adulto (pais, cuidadores, educadores, professores) deve estar atento. Procure uma avaliação pormenorizada em Terapia da Fala se:
– entre os 3 e 4 anos, a criança, não se faz entender fora do contexto familiar;
– aos 4 anos apresenta uma fala pouco percetível;
– aos 4 anos a criança trocas sons e produz, por exemplo, “dato” para “gato”; “guego” para “dedo”; “ábua” para “água”ou “paca” para “faca”;
– aos 5 anos a criança troca sons palatais (/Ch/, /J/) por sons alveolares (/s/, /z/) ou vice-versa – ex.: produz “sapéu” para “chapéu”; produz “zanela” para “janela” ou produz “chapo” para “sapo”; produz “pechego” para “pêssego”;
– aos 6 anos a criança não articula corretamente todos os sons;
– a criança omite sons específicos (nunca diz o som, mesmo que por repetição);
– a criança omite frequentemente sílabas nas palavras, principalmente quando a palavra é extensa/maior;
– fala à “sopinhas de massa”;
– ou a criança apresenta qualquer outra dificuldade que considere suspeita.
Apenas com uma avaliação pormenorizada e atempada é possível identificar possíveis dificuldades. E quanto mais cedo for, melhor será a evolução da criança.