É comum ver-se crianças que adotam um padrão de sentar “W” (como demonstram as imagens) e muitas vezes (sem culpas no cartório) é algo que “escapa” a pais e educadores, contudo traz uma grande preocupação aos profissionais de saúde que trabalham na área do desenvolvimento infantil.
Porquê?
Passo a explicar.
Primeiro, porque é que as crianças gostam de adotar este padrão ao sentar-se?
As crianças gostam frequentemente de brincar sentadas no chão e se durante essa atividade (fundamental ao seu desenvolvimento) poderem não se preocupar com equilíbrio tanto melhor. E é isso que o sentar em “W” proporciona à criança, uma maior sensação de equilíbrio, onde há estabilidade do tronco e anca e permite um manuseamento mais facilitado dos brinquedos (Altinel et al, 2007).
Contudo, e aqui entram as preocupações na área do desenvolvimento infantil, nesta posição a rotação do tronco da criança encontra-se diminuída e assim a sua musculatura terá tendência a ficar menos desenvolvida o que poderá resultar num desenvolvimento deficitário da coordenação bilateral motora e equilíbrio.
A aquisição de um padrão de sentar em “W” da criança pode:
- Gerar preocupações ortopédicas, pois sentar-se nesta posição aumenta a predisposição da criança à luxação da anca;
- Agravar a rigidez muscular em crianças com esta condição (ou com predisposição para contraturas), pois esta posição promove o encurtamento dos isquiotibiais, adutores do quadril, rotadores internos e tendões do calcanhar;
- Gerar preocupações neurológicas e atrasos no desenvolvimento motor, pois a estabilidade adquirida pela criança não implica grandes transferências de peso do seu corpo, nem reações de retificação postural e equilíbrio (Yaseen, 2016).
Como terapeuta ocupacional pediátrico preocupa-me sempre quando durante a observação ou avaliação de uma criança constato que há um padrão nesta posição aquando sentada.
E a minha preocupação advém de pensar a curto ou médio-prazo nas dificuldades inerentes ao desenvolvimento que serão agravadas com esta posição e com falta de estimulação de reações de retificação e equilíbrio do corpo. Com isto, e tentando simplificar ao máximo, quero dizer que estas dificuldades terão repercussões no topo da “pirâmide do desenvolvimento”, como por exemplo, a organização e construção de grafismos/escrita, aquisição de um controlo postural que permita uma escrita eficiente, recortar ou até um “simples” copiar do quadro para o caderno (entre outros).
Como evitar a adoção permanente deste padrão por parte da criança?
Primeiro devemos adquirir a consciência que crianças com problemáticas do desenvolvimento motor tendem a adotar com facilidade este padrão de sentar, protegendo-se das suas dificuldades, estando contudo, inconscientemente, a não proporcionar ao seu corpo as sensações requeridas para um desenvolvimento típico e agravando ainda mais a sua condição. E a partir daí, tornar esta nossa consciência também consciência da criança, promovendo a aquisição de novos hábitos. E aqui entra o lado bom, divertido e extremamente educativo e terapêutico de poder partilhar o chão com uma criança, desde dando nós exemplo das outras “mil” maneiras que nos podemos sentar, a promover naquele dia um jogo frente a frente, pés com pés, onde temos de apanhar tudo ao nosso redor para nossa piscina humana de pernas. É só usar a imaginação e um pouco do conhecimento partilhado.
João Da Avó
Terapeuta Ocupacional Pós-Graduado em Integração Sensorial (Ayres Sensory Integration®), Com formação em Introdução ao Conceito de Bobath em Pediatria, Integração Sensorial na Alimentação, Integração Sensorial no Autismo e Dificuldades da escrita Manual.
Referências bibliográficas:
Altinel, L., Köse, K. C., Aksoy, Y., Işik, C., Erğan, V., & Ozdemir, A. (2007). Hip rotation degrees, intoeing problem, and sitting habits in nursery school children: An analysis of 1,134 cases. Acta Orthopaedica Et Traumatologica Turcica, 41(3), 190.
Yaseen, S. (2016, fevereiro 8). A Glimpse into Early Years. Pediatric Services. Consultado em fevereiro 8, 2021, em http://www.pediatricservices.com/parents/pc-22.htm